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O IMPACTO DOS MEDICAMENTOS GLP-1 NOS NEGÓCIOS DE ALIMENTOS BRASILEIROS

Postado em 30/06/2025 por Cristina Leonhardt
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Março de 2026 marcará uma importante virada na indústria farmacêutica no Brasil: a expiração da patente da principal droga agonista do GLP1-1 – a semaglutida, princípio ativo do Ozempic. Até lá, a produção e venda da canetinha que conquistou cantoras, atores e lideranças mundo afora é restrita à Novo Nordisk – um mercado estimado em 11 bilhões de dólares em 2025. Além do Ozempic, outras drogas competem pelo mesmo espaço de redução de peso: entre elas liraglutida (marca comercial Victoza), dulaglutida (Trulicity), exenatida (Byetta), tirzepatida (Mounjaro) e lixisenatida (Soliqua).

Desenvolvidas para o controle de diabetes, as canetinhas têm sido usadas para outro fim que persegue a humanidade no século XXI: o emagrecimento, com resultados tão visíveis que impulsionam ainda mais a disseminação do seu uso (vale lembrar que a visibilidade dos benefícios é um dos 5 atributos da inovação que afetam a sua difusão na sociedade). O fim da pandemia nos encontrou mais obesos, mais sedentários e mais sedentos por aceitação em uma vida social ativa – cenário perfeito para todas as soluções que prometem corpos perfeitos.

Especialmente no Brasil, não é? Uma pesquisa realizada com cerca de 11.500 pessoas brasileiras entre 35 a 59 anos mostra que 85,2% das mulheres e 69,8% dos homens se sentem insatisfeitos com o excesso de peso – mesmo que apenas 59,4% das mulheres e 65,8% dos homens de fato apresentarem sobrepeso ou obesidade. Veja que a diferença entre a percepção corporal e a realidade é maior para mulheres do que para homens. Mais abaixo voltarei a falar sobre isso.

85,2% das brasileira adultas se sentem insatisfeitas com excesso de peso, porém apenas 59,4% delas têm sobrepeso ou obesidade

A quebra da patente no Brasil promete reduzir significativamente o preço destes tratamentos. Como as drogas GLP-1 podem afetar o mercado de alimentos brasileiro?

O que já sabemos do maior mercado de Ozempic: Estados Unidos

É inegável o impacto dos antagonistas de GLP-1 na indústria de alimentos americana. Um mercado que dependia de pessoas que não conseguiam parar de comer se deparou com uma mudança brusca de comportamento alimentar: 7 milhões de pessoas agora perderam o apetite.

A resposta ao Ozempic não se resume apenas à redução do consumo: os estudos realizados com pessoas que já usaram a droga ou que estão usando no momento mostram que há uma alteração no padrão de consumo, e que esta alteração pode se manter após o tratamento. Quais produtos saem da lista? Alimentos processados. Quais entram? Alimentos frescos e ácidos.

Um estudo acompanhou 22.712 domicílios americanos que tiveram ao menos 1 pessoas iniciando o uso de medicamentos GLP-1 entre janeiro de 2023 e julho de 2024 – e mediu suas compras de alimentos em diferentes canais (dentro e fora de casa) entre julho de 2022 (antes do início do uso) e setembro de 2024. Ele demonstrou que o impacto do uso de GLP-1 no consumo de alimentos se estende a todas as pessoas que moram numa mesma casa, mesmo que apenas uma delas esteja fazendo o tratamento. Os gastos domésticos caíram em média 5,5% dentro dos 6 primeiros meses de uso, sendo que as famílias de maior renda reduziram seu consumo em 8,6%. Snacks salgados foram os itens com maior redução de consumo: 11%.

A linha final: as pesquisadoras da Universidade de Cornell estimam em USD 416 a redução de gastos anuais por usuário de GLP-1. Se 7 milhões de americanos hoje usam a droga, estamos falando de uma redução de compra de alimentos da ordem de 2,912 bilhões de dólares (algo como 0,3% do mercado total de alimentos no país). Se a predição do J P Morgan Research estiver correta (30 milhões de americanos usando algum tipo de droga GLP-1 em 2030) estamos falando de uma redução de gastos de 12,4 bilhões de dólares nos domicílios americanos.

A alteração do padrão de consumo, com redução seletiva, também foi observada em outro estudo, realizado por pesquisadoras da Universidade de Arkansas e da Universidade Estadual de Oklahoma. Esta pesquisa, com 1955 participantes, comparou o perfil de consumo de pessoas que já usaram ou estavam usando algum medicamento GLP-1, com aquelas que pretendiam ou não usar.

Andrew Dilley, Saroj Adhikari, Pratikshya Silwal, Jayson. L. Lusk, Brandon R. McFadden. Characteristics and food consumption for current, previous, and potential consumers of GLP-1 s. Food Quality and Preference. 2025

É facil perceber que uma possível ameaça à indústria de alimentos é setorizada – com diferentes graus de redução de consumo conforme as categorias.

Uma análise recente da EY projeta uma adoção entre 13% a 21% por adultos americanos em 2034 – o que significa que 30 a 50 milhões de pessoas estará usando algum tipo de agonista do GLP-1. Segundo a consultoria, a adoção destes medicamentos pode afetar em até 12 bilhões de dólares o crescimento do mercado de snacks.

Um dos efeitos imediatos? Uma paralisação dos lançamentos de produtos inovadores. Mais precisamente, o nível mais baixo de lançamentos globais de alimentos e bebidas genuinamente novos desde 1996, segundo a Mintel. A indústria de alimentos ficou tonta e precisou recuperar o fôlego.

Lançamentos da Expo West 2025 focados em GLP-1

A segunda onda de reação da indústria de alimentos tem sido o lançamento de produtos que buscam apoiar a jornada das pessoas que usam a droga, cujos efeitos colaterais não se restringem à perda de apetite:

  • Saciedade de longa duração
  • Náusea
  • Diarréia
  • Constipação
  • Vômito
  • Perda de massa muscular
  • Envelhecimento facial

A YouTheory desenvolveu 3 produtos suplementos junto com um especialista renomado em obesidade: suplemento proteico, multivitamínico e suporte intestinal.

Diversas empresas vêm desenvolvendo produtos com probióticos, prebióticos e fibras para melhorar o equilíbrio da microbiota e reduzir desconfortos digestivos.

A Irwin Naturals se diferencia trazendo uma “alternativa mais natural à droga em si”. A empresa alega que o produto, quando consumido ao longo prazo, pode gerar resultados semelhantes às GLP-1.

(Participantes da nossa Cobertura de Inovação Expo West 2025 receberam estes insights em primeira mão, em tempo real, durante a Expo West 25.)

A respostas das grandes empresas aos efeitos da GLP-1

Em maio de 2024, a Nestlé anunciou o lançamento no final daquele ano de uma linha de alimentos congelados para pacientes em tratamento com medicamentes GLP-1. A Vital Pursuit traz uma linha de pratos prontos altos em proteína e com boa quantidade de fibras em porções reduzidas. É o primeiro lançamento de uma linha grande de produtos da empresa no mercado americano nos últimos 30 anos.

Alguns produtos da linha de congelados Virtal Pursuit

Já a Danone tomou outra rota: investiu em educação e comunicação do alinhamento do seu portfólio atual com as necessidades de quem está em tratamento.

Webpage da Danone América do Norte dedicada à dieta de pacientes GLP-1

A Conagra adicionou o claim “GLP-1 friendly” ao painel frontal de alguns produtos da linha Healthy Choice.

Carne com batatas e vegetais da linha Healthy Choice da Conagra

Coca-Cola e Mondelez, por sua vez, dizem estar monitorando o impacto do emprego das drogas GLP-1, que ainda consideram pequeno em seus negócios.

A resposta regulatória brasileira

Antevendo o mercado de 2025 e buscando reduzir o uso indiscriminado e com fins estéticos dos antagonistas de GLP-1, em 16 de abril de 2025 a Anvisa aprovou um controle mais rigoroso na sua prescrição e dispensação. A nova regra prevê uso de receita em 2 vias, que será retida na farmácia e durará apenas 90 dias.

Debates sobre GLP-1 no Brasil

Como as drogas GLP-1 estão penetrando e sendo aceitas no Brasil? Vamos tentar responder a esta pergunta pela lente cultural.

O símbolo máximo desta discussão em 2024 foi a cantora Maiara – que chegou a afirmar que estava pesando 45kg (tendo perdido 35kg). Parte de uma das duplas mais adorada do feminejo brasileiro, a cantora alega que seus resultados vêm de um foco na alimentação saudável e exercícios.

Cabeça de Ozempic

A perda de peso abrupta causada pelo Ozempic e afins causa uma mudança na proporção corpo/cabeça. Um corpo “menor” passa a impressão de uma cabeça “maior”, o que é apenas uma percepção. A internet apelidou este efeito de “cabeça de ozempic” – um traço sarcástico do humor brasileiro que demonstra que, ao menos aqui, o emagrecimento não está acima de qualquer coisa (e não é o grande objetivo estético). O termo também é usado na gringa (ozempic head), mas o interesse dos brasileiros é muito maior, como nos mostra a comparação global entre os termos no Google Trends (“cabeça de ozempic” em azul, “ozempic head” em vermelho).


Furto de Ozempic

Custando até 2 mil reais por aplicação e sendo a promessa do emagrecimento que tanta gente busca, é meio que natural que o Ozempic e seus primos virassem objeto de desejo – e, desta forma, fossem motivo para furtos. Uma história de uma suposta babá demitida por justa causa por usar o Ozempic da empregadora rondou a internet em 2024 – mesmo sem comprovação. O que foi comprovado foi um furto de mais de R$60 mil em Ozempic e Wegovy, em abril/25, na zona sul da cidade de São Paulo.

Ozempic no SUS

Em uma declaração minimamente controversa, o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, promete fornecer Ozempic nas Clínicas da Família até janeiro de 2026.

GLP-1 natural via inteligência artificial

A NotCo, conhecida por desenvolver alimentos plant-based a partir de uma inteligência artificial proprietária, anunciou no Web Summit Rio que irá lançar um produto que estimule o corpo a produzir naturalmente o hormônio GLP-1. A promessa feita no palco é vaga sua data de lançamento está prevista para o final de 2025, após ensaios clínicos. Resta saber o que a Anvisa vai pensar sobre esta alegação.

No que eu aposto: possíveis rotas de inovação para os negócios de alimentos brasileiros

Algumas das soluções encontradas pelas empresas americanas não serão possíveis no Brasil: vale reforçar que a ANVISA é muito mais rigorosa com alegações funcionais do que a sua parceira FDA, do berço do liberalismo econômico. Então, “amigável ao GLP-1” provavelmente não poderá ser usado por aqui – salvo que se encontre alguma ligação causal muito bem fundamentada entre a ingesta do seu alimento ou suplemento e os efeitos dos medicamentos GLP-1s.

A rota da reformulação tampouco me parece promissora. Se as pessoas estão lidando com a perda de apetite, ter mais ou menos gordura saturada não faz muita diferença.

O que eu vejo: refeições pequenas, produtos que reduzam a náusea e – claro – suplementos. Aliás, a indústria de suplementos pode tanto se esbaldar, quanto sofrer muito. Se as pessoas que se apoiaram nesta abordagem de emagrecimento virarem a chave para a via medicamentosa, a indústria de suplementos perde um importante segmento de atuação. Por outro lado, quem usa as canetinhas tende a ter acompanhamento médico e nutricional: duas importantes portas de entrada para esta mesma indústria. Quem viver, verá.

Uma linha de alimentos congelados de pequenas porções – focando nas proteínas fibras necessárias conter a perda muscular e garantir uma boa digestão.

Alimentos ácidos ajudam a controlar a náusea. Vegetais fermentados ácidos também apoiam a saúde intestinal, com a contribuição de fibras e bactérias ácido-láticas.

Um sistema produto-serviço focado nos indivíduos, que monitora continuamente seus marcadores de saúde, faz alertas para o usuário, encomenda canetas e direciona as dietas de acordo com o monitoramento realizado (fazendo compras de mantimentos diretamente no app).

Sim, mais suplementos proteicos – mas também muita fibra para lidar com a constipação. Quem consulta médicos e nutricionistas com regularidade pode começar a ingerir suplementações específicas para acompanhar o tratamento.

O que eu espero: que os negócios ajam com ética. A super-representação de corpos magros na mídia enviesa a percepção sobre os corpos das pessoas ao redor, estimulando a vergonha do corpo e sintomas depressivos. Estimular compulsões por corpos não naturalmente magros causam impactos devastadores, especialmente entre adolescentes e mulheres. Por exemplo, já sabemos que discursos negativos sobre o corpo têm relação com desordens alimentares. Nossa autopercepção é sempre influenciada fortemente pelo mundo ao nosso redor – quanto mais pessoas vemos usando medicamentos para emagrecimento, mais pensamos que todos usam. Mesmo que estes usuários não sejam a maioria.

Já tem gente se movimentando

A Liv Up firmou uma parceria com a Novo Nordisk para ser indicada pelo seu programa de relacionamento com pacientes Ozempic: o NovoDia. O programa também oferece descontos em farmácias, spas, consultas com psicólogos, orientações nutricionais, entre outros.

A Florien Fitoativo posiciona seu suplemento Akkermat para “evitar o efeito reganho de peso após o fim do uso das canetinhas”. Em maio/25, lançou o produto Biomansia, que “aumenta a produção de GLP-1 pelas células L intestinais”.

A Rousselot lançou uma linha de peptídeos de colágeno focados na complementação do uso dos medicamentos GLP-1 e no estímulo da produção natural de GLP-1 pelo corpo, para controle dos picos glicêmicos após refeições.

Como os medicamentos agonistas da GLP-1 podem afetar a sua empresa?

Inovar com impacto envolve capturar os sinais do ambiente externos, fazer uma construção própria de sentido e significado, e formular sistemas de solução de problemas que combinem produtos, serviços, comunicação e pessoas. Se a sociedade está debatendo os medicamentos GLP-1, ela afeta a sua empresa: mesmo que vocês vendam água. Como vocês podem interpretar estes sinais criativamente?

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